quinta-feira, 16 de janeiro de 2014
O futuro do motociclismo brasileiro
Quem
acompanha minha trajetória profissional, ficou surpreso com a aparente
ausência do cenário motociclístico em 2013. Recebi muitas mensagens me questionando, incentivando e cobrando.
Após 12 longos anos de trabalho
ininterrupto, desliguei-me da revista Moto Adventure, mas não do mundo
motociclístico. Dediquei-me praticamente o ano todo ao meu curso de pilotagem –
Performance Professional Riding – e a uma profunda análise do cenário que
vivemos, no tocante ao motociclismo. Nos próximos parágrafos verá o resultado
dessa análise e as consequências decorrentes.
A moto e a sociedade
Vivemos
uma conjuntura onde a moto se encontra mais marginalizada e menosprezada que em
qualquer outra época de nosso país. É a anticultura motociclística. A quantidade
e gravidade dos acidentes, bem como as notícias negativas relacionadas à moto são
os principais motivos, mas não os únicos.
O
drama dos acidentes e sequelas causadas atinge muito além do próprio
motociclista – são familiares, parentes e amigos, que passam de uma hora à
outra, a ver a moto como uma verdadeira encarnação do demônio, hostilizando o
objeto, esquecendo-se que ele próprio é incapaz de causar qualquer espécie de
dano, se não estiver sendo manuseado por uma pessoa. O dano causado por um
acidente de moto é muito mais abrangente que o próprio, tendo consequências
irreversíveis – qual pai ou mãe não insistiria com seu filho para abandonar o
motociclismo após um acidente? O que dizer de morte em família? Infelizmente, essa é a mentalidade brasileira.
Em
outra vertente, a grande maioria das notícias relacionadas à moto é negativa,
sendo as poucas ações positivas, ofuscadas pelo drama dos acidentes e crimes envolvendo a moto. Basta uma breve pesquisa na
internet usando o termo “moto” para ver por si só – aos olhos da sociedade que
consome qualquer tipo de informação, somos todos loucos ou bandidos.
Genericamente, com exceção da mídia especializada, as principais formas de
comunicação em massa, têm antipatia pelo motociclismo. Basta ver o espaço que
ocupamos na mídia televisiva, que é quase inexistente.
A conclusão é óbvia – estamos nos afundando na lama, por falta de ação. Nossa e das autoridades que regulamentam o setor.
Moto x Estado
Os
governantes, historicamente, nunca se preocuparam muito com o setor – éramos
inexpressivos em número e quantidade de problemas gerados, não merecendo
qualquer política de estado. A não ser os incentivos fiscais para a produção. Favor
não confundir política de estado com política de governo. A primeira transcende
os governos temporários. A preocupação maior do estado sempre foi, muito
apropriadamente, diga-se de passagem, no âmbito do transporte público, uma vez
que a grande maioria da população depende exclusivamente deste tipo de
transporte para sua locomoção.
Mas
com o aumento da frota de motocicletas, com a continuada falta de investimento
na qualificação dos condutores e o crescente uso da moto por parte de
criminosos, nos tornamos um “baita” problema para o estado e a sociedade. Bem
maior que os benefícios que a indústria do motociclismo gera em riqueza,
impostos e empregos.
Tornamos-nos,
simultaneamente, problema de saúde e segurança pública!
Essa
imagem negativa da moto e de seu usuário, associada à falta de coesão e
representatividade da classe, permitiram que diferentes órgãos e autoridades se
vissem no direito de querer legislar sobre a matéria sem qualquer critério
lógico, quanto mais técnico. Cito alguns exemplos: o juiz que proibiu o uso de
capacetes em uma cidade do interior baiano há alguns anos, a tentativa de
proibição de garupa em moto, ou ainda esta preciosidade:
Texto
encontrado em apostila fornecida pela CET para uso no treinamento de motofretistas.
Onde
está o Ministério Público nessas horas para perguntar à presidência desta
companhia, subordinada a Prefeitura de São Paulo, porque este organismo tenta
impor medidas restritivas ao fluxo de veículos, quando tem em suas diretrizes
promover a mobilidade e a livre circulação?
Como
essa companhia determinou o que é, ou não, seguro para um motociclista, quando
a comunidade técnica sequer foi ouvida? Onde está a base de argumentação que
sustente tal afirmação? Somente um motociclista mal preparado poderia
eventualmente concordar com tal premissa.
Simples comparação
Observem
agora o que aconteceu com o ciclismo ao longo dos anos, e mais precisamente, ao
longo da última década – principalmente nas grandes metrópoles. De uma hora pra
outra, o ciclismo ficou em evidência – prefeituras se movimentaram para criar
ciclovias, faixas reversíveis e campanhas para uso da bicicleta.
Por
favor, não me entendam mal. Adoro andar de bicicleta e apoio o ciclismo nas
mais diversas formas e modalidades.
Mas
vamos agora fazer uma pequena comparação do que aconteceu ao ciclismo nesse
período e o que aconteceu ao motociclismo. Quem pode me dizer quando existiu
uma única campanha governamental para uso da motocicleta? Em meus 40 anos de
duas rodas, não me recordo de ter visto. Talvez esteja caducando, mas nos
últimos 20, tenho certeza que não houve. No entanto, o ciclismo ganhou força e
notoriedade por conta da articulação de pequenos grupos, principalmente
ambientalistas, que souberam se organizar e articular seu movimento.
E
nós? O que fizemos?
Fora
as singelas tentativas individuais por parte da mídia especializada e pilotos
profissionais em educar os motociclistas quanto a procedimentos e conduta
salutar, quem mais agiu a favor do motociclismo? A maioria dos fabricantes acordou
para essa realidade apenas recentemente, há menos de uma década, e mesmo assim de
forma tímida – principalmente porque viram que seus lucros estavam em jogo.
Pois
é. Nosso estilo de vida está caminhando para a inviabilidade.
E agora?
Todos
os problemas à parte, vivemos também um momento ímpar na história – 2014 é um
ano de eleições e nós motociclistas somos agora um número expressivo de
eleitores. O que falta é nos unirmos em torno de temas fundamentais para o
futuro do motociclismo no país e nos articularmos para tirar vantagem máxima
desta oportunidade – antes que seja tarde demais para reverter o infeliz quadro
que ajudamos a pintar.
Não
há na história da humanidade qualquer grupo de pessoas que tenha obtido sucesso
com lutas individuais.
É
a partir da união, que pressões podem ser exercidas para colocar nos eixos tudo
de errado que estamos tão cansados de observar.
Discurso
político? Não! Não sou candidato a nada!
Mas
também não quero ficar de braços cruzados e permitir que pessoas sem qualquer
conhecimento desse fantástico veículo, criem políticas que me afetam.
Estes
foram os motivos que me levaram à criação do “Movimento pela Valorização do
Motociclismo - MVM”, uma organização que pretende reunir os mais diversos
profissionais do motociclismo, mas principalmente aqueles da comunidade técnica
e da mídia especializada, para debater e chegar a um consenso sobre questões
que afetarão nosso futuro.
A
meu ver, o Movimento terá a responsabilidade de debater os temas reconhecidamente
problemáticos, chegando a um consenso sobre que rumo adotar.
Os
temas discutidos serão finalizados na forma de documentos participativos, onde
todos os membros tenham opinado até que valores homogêneos, ou votados pela
maioria, expressem a opinião de todo o grupo acerca do tema abordado.
Estes
documentos serão então encaminhados para os órgãos oficiais que representam a
comunidade motociclística, (Ex: ABRACICLO, CBM, ABRAM, etc.) com a finalidade
de dar sequência e ação necessárias para implementação das conclusões obtidas,
junto às autoridades que regulamentam o setor.
Por
fim, as conclusões de temas técnicos também serão apresentadas coletivamente à
ABNT, para possível normalização de seu conteúdo, com vistas à padronização – Ação extremamente importante para dar
sustentação aos pleitos.
Os
documentos produzidos terão grande valor político por terem sido propostos pela
comunidade técnica, que reúne os profissionais mais gabaritados para a tarefa.
Como a maioria deste grupo também tem participação em diversas mídias, teremos
condições de pressionar os órgãos responsáveis de maneira pública, com extrema
visibilidade, respaldados pela opinião constituída coletivamente.
Independente
dos resultados, eu acredito que a maioria de nós dormiria mais tranquilamente
por ter feito algo de concreto – invés de apenas reclamar. Temos de ter em
mente que se tem alguém que de fato possa fazer algo a respeito da atual
situação, este alguém somos nós. Afinal de contas, somos referência em vários
âmbitos do motociclismo, frequentemente sendo tratados como “especialistas” e “formadores de opinião”, não
é mesmo?
Pelo
que pude notar ao longo dos anos de convivência com a comunidade técnica e o
meio jornalístico, existe certa uniformidade nas ideias, sendo as arestas
poucas e relativamente fáceis de aparar. Basta um pouco de empenho e dedicação
dos membros, para nos tornarmos uma voz forte e determinante. Mesmo as ideias
contrárias terão sua manifestação assegurada através da metodologia, garantindo
que os documentos democraticamente produzidos sejam espelho da vontade da
maioria.
Escolhi
como plataforma operacional a seção de grupos do Facebook®, combinada ao
recurso do Google Docs®, por constituírem a plataforma mais versátil, permitindo
agilidade na comunicação entre os membros. Podemos ainda contar com a
ferramenta de voto oferecida no Facebook® para ordenar e deliberar de forma
construtiva sobre os mais variados temas. Uma vez organizados, poderemos migrar
para plataformas que eventualmente sejam mais produtivas.
Enfim,
finalizo com o convite à todos os profissionais do motociclismo, de cada um dos
estados brasileiros, representantes de fabricantes e associações do setor, bem
como qualquer motociclista que tenha opinião fundamentada, a participar dessa
luta, que em minha modesta opinião, pode sim, gerar frutos positivos para o
nosso estilo de vida. Apelo principalmente aos meus pares, que demonstraram
tanta capacidade e sensatez em inúmeros artigos relacionados à segurança
motociclística, que ponderem acerca do proposto e se unam a mim nesta
empreitada.
Vamos dar um jeito nessa
zona !!
Nota do autor:
Peço
a gentileza de compartilhar este texto com quem achar que pode contribuir,
tendo em mente que se trata de trabalho acadêmico que precisa de argumentação e
contra-argumentação para poder surtir o efeito que desejamos. As pessoas
participantes terão que possuir obrigatoriamente essa capacidade argumentativa,
embasando suas opiniões no conhecimento técnico e científico.
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